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Foto do escritorDouglas Ceconello

Campanha da Volkswagen com Elis Regina reacende debate sobre direitos autorais e os desafios éticos


Volkswagen, Elis Regina e o debate sobre deepfake e direitos autorais
Campanha da Volkswagen com Elis Regina reacende debate sobre direitos autorais e desafios éticos

Você já parou para pensar como seria se deparar com a sua própria imagem fazendo algo que você nunca fez realmente? Ou se a emoção que sentimos assistindo um artista seria diferente se a gente soubesse que aquela interpretação é fruto de inteligência artificial?


Essas são algumas das questões que ganharam força após o lançamento da campanha publicitária da Volkswagen que recriou Elis Regina através do uso de deepfake. Na peça, a versão digital da artista, que faleceu em 1981, canta o clássico “Como nossos pais” junto com a filha, Maria Rita.


No vídeo, que não demorou para viralizar, a Volkswagen promoveu um emocionante encontro entre a cantora Maria Rita e um deepfake de Elis Regina, desenvolvido com detalhes impressionantes pela inteligência artificial. A peça é resultado da parceria entre a agência AlmapBBDO, a Boiler Filmes e uma empresa norte-americana de pós-produção.


O processo de inteligência artificial envolveu uma combinação de reconhecimento facial, com imagens e expressões de Elis Regina, amparada pela atuação de uma dublê, alcançando um resultado extremamente realista.


Ainda que os termos do contrato não sejam conhecidos em detalhes, é possível supor que Maria Rita seja detentora dos direitos autorais da mãe, portanto não haveria maior problema neste sentido. A própria Volkswagen manifestou-se e afirmou que o uso da imagem de Elis Regina havia sido acordado com a família.


No entanto, não foi este o entendimento do advogado Gabriel de Britto, que fez denúncia ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), afirmando que a cantora, já falecida, não poderia “reivindicar o uso da própria imagem”. “Importante esclarecer que o direito de imagem protege a personalidade física da pessoa, como traços pessoais, corpo, atitudes, gestos, entre outros, já o direito autoral protege a obra criada pela pessoa. E o que se transmite aos herdeiros é apenas o direito autoral”, afirma o documento apresentado ao Conar.


Para Ricardo Preis, da Marcar Marcas e Patentes, o tema permite outras leituras. “As pessoas não herdam a exploração da imagem, mas é mais ou menos relativo, pois é possível que uma pessoa venda sua imagem para uma empresa, o que acontece muito com modelos.”


A imagem pessoal e os direitos autorais são questões diferentes, mas “é possível constituir sobre o seu direito de imagem um instrumento de cessão ou permissão de uso, de alguma forma que um terceiro possa explorar, até mesmo alguém estranho à relação familiar”.


Christian Stroeher, da Marcar Marcas e Patentes, lembra que recriar personalidades já falecidas não é exatamente uma novidade – em 2014, utilizou-se o recurso de um holograma para tornar possível um show de Michael Jackson, falecido cinco anos antes. “A questão está em como é explorado, a forma como a imagem está associada, se o efeito é positivo ou negativo, especialmente do ponto de vista da pessoa que tem sua imagem associada a determinado produto”, complementa.


A recriação realista de Elis Regina emocionou muita gente, levantou a questão dos direitos autorais e também reacendeu o debate sobre os limites éticos do uso de deepfake, tecnologia que cria áudios e vídeos falsos extremamente realistas, que pode ser utilizada tanto para o bem como para o mal, seja na publicidade ou em diferentes segmentos de comunicação (em campanhas políticas, por exemplo).


O uso de deepfake em geral está associado à pornografia e não é tão comum em campanhas publicitárias — a Volkswagen lançou mão da tecnologia justamente com a intenção de vincular sua marca à inovação (e ao mesmo tempo, através de Elis Regina, também à tradição).


O que é deepfake? Normalmente relacionada à pornografia ou às fake news, a tecnologia de deepfake produz conteúdos sintéticos (não reais), sendo capaz de modificar ou sobrepor rostos digitais em imagens reais. A partir de uma grande quantidade de arquivos reais de determinada pessoa, a tecnologia utiliza inteligência artificial (IA) para criar vídeos falsos, ainda que extremamente realistas, de pessoas em situações das quais elas nunca participaram.

O termo nasceu em 2017, quando um usuário do Reddit que usava o username de “Deepfake” passou a postar vídeos pornográficos falsos com mulheres famosas, utilizando softwares de machine learning (aprendizado de máquina), que “aprendem” a simular as expressões de uma pessoa para aplicá-las em vídeos já existentes. Logo, o termo deepfake logo passou a ser um sinônimo para vídeos editados através de IA.



Quando é legal e ético usar deepfake No Brasil, a Lei de Direitos Autorais permite o uso de deepfake na criação de paródias a partir de obras já existentes, contendo uma abordagem crítica, irônica ou satírica, bem como na personalização de conteúdo, quando o usuário, por exemplo, pode escolher a voz em que vai ouvir uma música. E, como no caso da campanha da Volkswagen, também em peças publicitárias autorizadas pelos detentores de direitos de imagem, autorais e intelectuais. Quando deepfake é nocivo O uso de deepfake merece a atenção que vem gerando justamente porque a ferramenta é comumente associada a aplicações nocivas, como a criação de pornografia utilizando o rosto de terceiros, o que já aconteceu com várias atrizes – segundo relatório da Deep Trace, empresa especializada em segurança na internet, 96% dos vídeos que utilizam deepfake estão relacionados à pornografia.


Outro uso ilegal e antiético é a disseminação de fake news no campo político através da manipulação de imagem e voz de personagens importantes. Em 2018, o site de notícias Buzzfeed produziu um vídeo de Barack Obama utilizando deepfake justamente para alertar sobre os perigos da manipulação de imagem e discursos no ambiente político.

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